Roberta Simoni além da vertente jornalística, literária e fotográfica é uma contadora de histórias inveterada e incurável. (robertasimoni.com.br)
Mesmo com esse currículo brilhante, conheci seu trabalho só agora. E, ainda bem que o conheci. Estou encantanda com sua habilidade de manusear as palavras. Encantada. Li inúmeros textos dela essa noite (janeladecima.wordpress.com) e me impressionei com cada relato, com cada opinião. Escolhi, com muita dificuldade, um deles para postar hoje. Confesso, também; que foi difícil encontrar uma imagem que, como dizia minha avó; ornasse com a cor do texto. Demorei para enxergar, mas a resposta era óbvia.
Foto de Roberta Simoni - Abandono
Ela estava aí, do seu lado, todo o tempo,
e só agora que ela foi embora você percebeu o quanto a ama e que não
pode viver sem ela, aí você saiu feito um louco pela rua, pegou um táxi,
mandou o motorista acelerar o máximo que pudesse, mas o trânsito
estava completamente congestionado, então você abandonou o táxi e foi
correndo mesmo, entrou no aeroporto empurrando as pessoas, se
desculpando, tropeçando e derrubando as bagagens que estavam pelo
caminho, mas quando chegou no portão de embarque, ela já tinha entrado
no avião, que decolaria nos próximos minutos. Você tentou ultrapassar o
portão mesmo assim, mas, obviamente, foi barrado pelos seguranças porque
estava sem o bilhete de embarque. Aí você pediu - na verdade você
implorou – para que deixassem você passar, argumentou que o amor da sua
vida estava dentro daquele avião e que se você não a impedisse, ela
partiria para nunca mais voltar. Ficaram comovidos e, com alguma
resistência, deixaram você entrar. Quando você alcançou o avião, a
tripulação já havia sido avisada e estava à sua espera, a
aeromoça (particularmente emocionada) comunicou aos passageiros o motivo
do atraso do vôo e chamou sua amada pelo nome, que se levantou, sem
entender nada, até o momento em que te viu vindo ao encontro dela. Vocês
trocaram olhares apaixonados. Ela quis que você explicasse o que estava
fazendo ali, e você finalmente disse, em alto e bom tom, que não
conseguia imaginar sua vida sem ela e a pediu em casamento. Ouviu-se um
coro de “Óhhhhhh” de comoção dentro do avião. Ela disse sim
e vocês se beijaram demoradamente, enquanto os passageiros aplaudiam
entusiasmados àquela cena de amor. A aeromoça suspirou, desejando viver
um amor assim algum dia, e…
…The End. Começaram a subir os créditos do filme, música do Roxette
tocando ao fundo, as luzes do cinema se acenderam e as pessoas
começaram a se levantar. Alguns casais ainda resistiam sentados, aos
beijos, envolvidos pelo clima de romantismo cinematográfico, mas cedo ou
tarde teriam que levantar, dar ao mãos e ir embora viver a vida real…
Eu não satirizo o amor romântico, só acho que, certas coisas, só funcionam bem nas telas do cinema, isto é, quando
funcionam. Esse roteiro onde o mocinho passa o filme inteiro sem notar o
amor platônico da mocinha e só no final descobre o seu amor por ela, ou
da fulaninha que durante toda a estória não dá o devido valor ao
fulaninho e no fim, decide ficar com ele e os dois são felizes para
sempre não cola… não mais.
Pode ser que um dia eu entenda, mas acho pouco provável… se tem uma dúvida que levo comigo dessa vida é essa: por que as pessoas só dão valor depois que perdem?
Teoricamente não seria mais simples
valorizar o que está ao alcance das mãos, diante dos olhos do coração?
Então, por que na prática é tão diferente? É como se alguma coisa
encobrisse a visão enquanto você ainda tem ao seu dispor e depois, ao
perder, como num passe de mágica, você passasse a enxergar o que antes,
misteriosamente, não via.
Por que só agora que eu não te quero mais? - foi a pergunta que eu fiz, anos atrás, para um ex-namorado. Não sei…
– foi o que ele me respondeu com sinceridade. Pois é, nem eu sabia, e
ainda não sei e, provavelmente, nunca vou saber, tampouco entender.
Porque os anos passam e eu vejo as pessoas cometendo os mesmos erros
tolos, de olhos vendados, perdendo de vista grandes amores, deixando
escapar a magia do relacionamento construído no cotidiano a dois, para
depois terem tristes estórias de amor para – não - contar. Sim, porque, me desculpem, mas, eu não tenho interesse em escutar.
E eu espero que as chances tão logo se
esgotem, porque é puro desperdício de tempo e desgaste do amor que, se
ainda não se esgotou, pouco sobrou para gastar. E eu não quero que ele
termine com ela. Eu quero que ele entre no avião e, por conta do atraso
do vôo, os passageiros estejam esbravejando contra ele, que irá
encontrá-la acompanhada de um cara bem mais gato que ele – e apaixonado
por ela agora! Exatamente agora, quando ela também está
apaixonada por ele, e não amanhã, quando ela, cansada de amar por dois,
for embora. Eu quero é ver gente se amando “tudo-junto-ao-mesmo-tempo-agora”,
não em tempos e mundos distintos. Quero escutar falar de estórias de
amor que começam e terminam juntas, embora, fatalmente, tantos acabem
separados antes do fim. Mesmo assim, o que eu quero é ver recíprocos
começos, meios e fins de amor mútuo, independente do desfecho, um “durante feliz”, porque “final feliz” só não me apetece, nem me convence… não mais.
E você, meu bem, trate de se engraçar com
a aeromoça que se derreteu toda com seu romantismo descartável e seu
amor tardio, porque dessa vez (confesso que sinto um prazer cretino em
dizer isso) você até alcançou o avião, mas chegou tarde demais, baby…
[Roberta Simoni - Tarde demais, Baby...]
Fatídico! É, eu aprendi o significado.. Uma vez me ensinaram.
ResponderExcluirQue preciosidade!
ResponderExcluirObrigada por ler palavras, imagens e pessoas com tuas lentes especiais. ;)
Ela é o dedo que me aponta para a lua, doce garota!
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